Subsídio à energia vira 'vício' em países emergentes

March 24, 2014 | Categoria: Energy

Por Brendan Greeley | Bloomberg Businessweek

Mais uma vez, a Ucrânia está recorrendo à Europa e ao Fundo Monetário Internacional (FMI) para obter ajuda, dessa vez, um socorro de US$ 15 bilhões. Durante anos, as negociações com o FMI tinham empacado devido a uma única questão: a Ucrânia gasta 7% de seu Produto Interno Bruto (PIB) em subsídios aos consumidores de gás natural. O FMI quer essa ajuda reduzida em um terço, antes de aprovar um empréstimo.

Violetta Viktorova, uma médica em Kiev, diz que se o FMI conseguir o que deseja, as contas de eletricidade que ela e o marido pagam vão subir. "Não sobra nada dos nossos salários no fim do mês. O aumento no preço iria tornar nossa vida mais difícil", diz ela, que nem seria tão afetada quanto os pensionistas do país. A Ucrânia está negando o pedido do FMI.

 

No mundo em desenvolvimento, é tentador, para um país, manter artificialmente baixo o preço dos combustíveis fósseis. O subsídio pode assumir a forma de um preço máximo, que impede que as petrolíferas cobrem um valor exagerado nos postos de abastecimento. Ou pode assumir a forma de uma redução de impostos cobrados a um produtor nacional de petróleo, que, então, geralmente repassa o diferencial (aos consumidores). Nos dois casos, o governo tem que arcar com a diferença.

Subsídios geralmente são criados como uma tentativa de evitar inflação e proteger os cidadãos contra o impacto doloroso de aumentos dos preços no mercado mundial de energia. Mas os subsídios à energia são caros; eles comem os orçamentos nacionais. Os benefícios acabam indo principalmente para os cidadãos mais ricos e impedem investimentos governamentais mais produtivos em educação ou infraestrutura e reduzem a eficiência energética. Subsídios interferem com a lei da oferta e demanda, desestimulando investimentos tanto em energias alternativas como na exploração de combustíveis fósseis.

"É uma política fadada ao fracasso", diz Fatih Birol, economista-chefe da Agência Internacional de Energia (AIE), "mas vemos que muitos países continuam a praticá-la". Os subsídios persistem porque, como sabem os políticos ucranianos, a eliminação de um subsídio dói imediatamente no bolso dos cidadãos, provoca queda no apoio popular e, por vezes, até mesmo turbulência social.

O FMI estima em US$ 1,9 trilhão o favorecimento governamental em todo o mundo ao consumo de derivados de petróleo, energia elétrica, gás natural e carvão, ou 2,5% do PIB global em 2011. Esse número inclui os custos de danos causados por combustível subsidiado à saúde pública, ao meio ambiente e à infraestrutura; subtraídos esses custos, os países ainda gastam US$ 480 bilhões por ano em subsídios, ou 0,7% do PIB mundial.

Essas despesas estão concentradas sobretudo no Oriente Médio, Ásia, Europa Central e países da ex-União Soviética. O país que mais subsidia o gás natural, com 26% de seu PIB, é o Uzbequistão. A Venezuela subsidia os preços do petróleo no mercado interno em cerca de 8% do PIB, no Iraque, são 14%. Os EUA, maior provedor de subsídios no mundo desenvolvido, depois de Luxemburgo, subsidia gás e diesel no equivalente a 2% do PIB.

Os esforços pela manutenção dos subsídios aos combustíveis intensificou-se quando os preços da energia subiram, em meados da década de 2000. As economias em desenvolvimento aumentaram seus subsídios para acomodar a evolução dos preços mundiais.

Na Ucrânia, os subsídios aumentaram quando a Rússia começou a cobrar mais, durante as agora denominadas "guerras do gás", em 2004 e 2009. Desde 2007, quando a AIE começou a monitorar os subsídios, eles cresceram 40% na Ucrânia. Ao constatar essa tendência preocupante, o FMI, o Banco Mundial e a AIE assumiram os cortes nos subsídios como uma prioridade em nível mundial.

Os governantes gostam de rotular os subsídios aos combustíveis de "programas sociais". Mas a maior parte da ajuda não chega aos pobres. O FMI diz que 61% do benefício de subsídios à gasolina vão para os 20% de cidadãos que possuem carros; o número é um pouco menor para o diesel e o gás natural. "Os pobres passam fome se perderem um dia de trabalho", diz Ramadan Mohamed, um vendedor ambulante de maçãs no Cairo, "mas apesar disso, são os ricos quem têm acesso a subsídios". O Egito gasta 9% do PIB para manter baixos os preços da gasolina.

Subsídios aos combustíveis também geram perda de eficiência, diz Birol, da AIE. De acordo com o Banco Mundial, a intensidade energética, uma medida da quantidade de energia utilizada para a geração de cada US$ 1 mil de PIB, é duas vezes mais alta na Ucrânia do que na Letônia ou na Estônia, economias pós-soviéticas que reduziram seus subsídios.

Subsídios ao consumo de petróleo e de gás suprimem investimentos na exploração de petróleo e de energias alternativas. O Brasil, que conseguiu reduzir os subsídios à gasolina na década de 1990, voltou a adotá-los em 2011, quando a inflação ressurgiu, alimentada em parte pelo aumento dos preços dos combustíveis.

A Petrobras tem sido obrigada a comprar gasolina no exterior e vendê-la no mercado interno com um desconto de 15%. As compras de gasolina estão causando prejuízos que tornam mais difícil para a empresa desenvolver suas novas descobertas de petróleo sob o leito do mar. E essa política de subsídios tornou mais difícil para os produtores brasileiros de etanol competirem no mercado. Os investimentos em produção adicional de etanol caíram, desde o seu pico em 2008.

Os consumidores, que são também eleitores, costumam ver apenas os benefícios de subsídios, dificultando sua eliminação pelos políticos. No ano passado, o FMI elaborou uma lista, por país, de reformas para corrigir as distorções de subsídios no setor energético empreendidas desde a década de 1990. De 22 tentativas, o FMI considerou 12 bem-sucedidas.

O FMI e a AIE recomendam os mesmos passos básicos para suprimir os subsídios. Os países devem parar de ocultar os custos dos subsídios das vistas de seus cidadãos. Tanto o Brasil como a Ucrânia os ocultam nas contas de estatais do setor de energia. É preciso contabilizar os subsídios como um item de custo explícito no orçamento, diz Birol, da AIE, para que os cidadãos compreendam que estão pagando a conta por uma política errônea.