Tamanho da queda do PIB da construção ainda é imprevisível

June 09, 2020 | Categoria: Engineering

Por Rafael Marko 

O setor da construção deverá ser bastante afetado em 2020 pela crise econômica derivada da pandemia de Covid-19. Entretanto, o tamanho da queda dependerá do ritmo que o setor conseguir imprimir à atividade ao longo do ano, e de outros fatores, como o de acontecer ou não uma segunda onda da epidemia.

Este foi o cenário discutido na reunião de Conjuntura do SindusCon-SP, coordenada pelo vice-presidente de Economia, Eduardo Zaidan. Ele lamentou que, apesar da pandemia, o governo não aproveite o espaço existente para avançar nas reformas e tomar outras iniciativas que, a seu ver, farão toda a diferença na hora da retomada.

“A renda continuará em queda e o governo deveria injetar recursos, mantendo empresas saudáveis e colocando dinheiro no bolso das pessoas, por exemplo, reduzindo dificuldades para a geração de emprego. De qualquer forma, a crise vai afetar a todos. Quando a tempestade é muito grande, por melhor que seja a capa, todos se molham, alguns mais, outros menos”, afirmou o vice-presidente.

Já o presidente do SindusCon-SP, Odair Senra, destacou o isolamento social  como um fator positivo para o crescimento do setor imobiliário. “Ficou provado que morar bem não é só um bom investimento, como é necessário. O imóvel se valorizou. E haverá um esforço medonho do setor por sua recuperação, uma força desconhecida que pode ajudar muito.”

Retomada lenta

Ana Maria Castelo, coordenadora de Projetos da Construção da FGV/Ibre, mostrou os efeitos da crise sobre o setor até abril e os resultados da Sondagem Nacional da Construção feita pela instituição em maio.

Segundo a apresentação da economista, o patamar de incerteza econômico dos empresários da construção, medido pela FGV, é o mais elevado entre os setores. A expectativa captada é de que a recuperação do setor deverá ocorrer no fim do primeiro trimestre do ano que vem. Por isso, a retomada poderá ser lenta, com a crise afetando tanto a oferta como a demanda. “Não haverá retorno ao patamar anterior da economia, no médio prazo, o número de desempregados e desalentados vai crescer e isso afeta a construção”, afirmou.

Ana Maria ainda citou o fato de que alguns lançamentos imobiliários foram cancelados, e outros adiados. Com essa postergação do ciclo da construção, a taxa de crescimento do setor, existente antes da crise, não deverá ser mantida.  “O que vai acontecer no mercado imobiliário tem a ver com a incerteza, alguns podem correr para o imóvel como ativo mais garantido, mas é um percentual pequeno, a maioria da população depende da renda. Na melhor das hipóteses, a recuperação do mercado imobiliário será postergada”, observou.

Para a economista, ainda é cedo para se falar em inadimplência no crédito imobiliário, sendo necessário aguardar o que acontecerá quando se encerrar o período de adiamento dos vencimentos das parcelas dos contratos de financiamento.

Em relação ao desenvolvimento das obras de infraestrutura, ela comentou que isso dependerá da capacidade de estados e prefeituras continuarem pagando os contratos a seu cargo e da criação – ou não – de uma agenda pós-cíclica comandada pela infraestrutura.

Abalo estrutural

Robson Gonçalves, professor da FGV, observou que não dá para prever como a economia sairá da crise. Segundo ele, houve um abalo estrutural na economia do mundo e do Brasil. O nível de confiança de empresários e consumidores está mais baixo do que no período do impeachment da Dilma, o que denota freio nos investimentos. Na indústria, a queda foi tão significativa quanto a que ocorreu na crise dos caminhoneiros e a recuperação pode ser mais ou menos lenta. Setores mais atingidos, como a indústria automobilística e de confecções, devem ter recuperações até o final do ano, afirmou.

Segundo o economista, a queda da taxa de câmbio e o crescimento do Ibovespa mostram reação rápida ao diferencial coberto de juros (a diferença entre a taxa interna e a externa, considerando o futuro da economia). O último relatório Focus prevê que se chegue no final do ano a uma taxa Selic de 2,25% e a um IPCA 1,50%. “Uma taxa real, mesmo baixa, é uma boa opção tanto para o investidor nacional como para o estrangeiro, onde as taxas estão negativas. Mas isso não reflete a economia real”, ressalvou Gonçalves.

Embora os estados conseguiram recursos do Congresso para cobrir parte da perda de arrecadação, esta ainda é incerta no segundo semestre, acrescentou. A retomada dependerá do equacionamento da relação dívida/PIB, que aumentará de modo significativo. O déficit público aumentará por conta de mais despesas e menos arrecadação.

O economista destacou que há grande paralisia da política econômica e a ausência de uma nova política habitacional. “A impressão é de que o ministro da Economia espera a tempestade acabar para reassumir o leme, o que eleva o nível de incerteza. Parece que ele segue o que disse dom João 6º, antes de deixar Portugal em 1808: quando não se sabe exatamente o que fazer, o melhor é não fazer nada.”

Gonçalves chamou a atenção para a necessidade de uma política de recuperação do emprego, fazendo da construção uma alavanca. Como as famílias sairão endividadas da crise, será necessário um programa habitacional voltado para a baixa renda com recursos do Tesouro, preconizou.